História da Moagem de Trigo


1 - INTRODUÇÃO
O trigo tem sido, por milhares de anos, um dos alimentos básicos do ser humano, e a história de sua produção, processamento e consumo tem estado ligada aos processos de civilização do homem pré-histórico e de industrialização do homem moderno.
Desde que o ser humano começou a se estabelecer em comunidade permanente algum tipo de, grão tem sido cultivado para a sua alimentação, e os pastos selvagens de cereais devem ter provido os primeiros suprimentos de grãos alimentares. Descoberto há 75.000 anos atrás, o trigo deve ter logo apresentado uma grande vantagem sobre os outros alimentos para o homem primitivo pois, se armazenado em lugares secos, podia ser digerido semanas ou mesmo meses depois.
Tendo a agricultura provavelmente começada há cerca de 10.000 anos, certamente, portanto o trigo foi uma das primeiras cultivadas. À medida que a civilização vagarosamente progrediu, o homem aprendeu a selecionar as sementes de plantas com as melhores características, e assim aperfeiçoou a produção de uma de suas fontes primordiais de alimentos. Como resultado, foi capaz de mudar sua experiência nômade de caçador e de colhedor de frutas e vegetais para o estilo de vida mais fixo de agricultor. A agricultura ampliou o número de habitantes que uma área de terra era capaz de alimentar e, deste modo, as comunidades puderam se estabelecer começando o processo civilizatório. O trigo, portanto, pode ser considerado uma das pedras angulares da civilização humana.
2 – O PILÃO E O ALMOFARIZ
Na Idade da Pedra o cultivo do trigo se realizava de forma muito precária. Originário da Ásia Menor, ele se espalhou lentamente através desta região e para o leste. Pelo ano 2000 AC tinha se estendido através de todos os países mediterrâneos, até mesmo para o norte da França e Dinamarca, e também entrando na Índia e na China.
Inicialmente o homem comia o trigo da maneira como o achava, mesmo sendo as antigas variedades mais duras que as de hoje. Depois de uma limpeza bastante sumária, deixava-o cair de uma certa altura soprando as através do fluxo para remover as cascas.
Para facilitar o trabalho da mastigação e a assimilação do aparato digestivo, começou a bater previamente os grãos entre duas pedras, conseguindo assim desprender melhor as sementes comestíveis de suas cascas. Utilizando - se deste método de abatimento, há cerca de 10.000 anos foi desenvolvido o sistema do pilão e almofariz, inicialmente sob a forma de tronco oco de árvore como almofariz e de um galho arrancado como pilão, e posteriormente como o uso de pedras trabalhadas.
Este método de trituração não era muito eficiente, sendo sua única vantagem que duas pessoas, com dois pilões, podiam operar alternadamente ao mesmo tempo e acelerar o processo. Provavelmente cada habitação possuía sua própria unidade de pilão e almofariz, sendo parte da rotina matinal triturar grãos em quantidade suficiente para as necessidades do dia.
Como era comido o repasto obtido? Nos tempos mais longíquos era provavelmente apenas umedecido com água para formar uma pasta. Mais tarde esta pasta começou a ser cozida na forma de mingau, que é ainda hoje a maneira como muitas pessoas comem seus cereais na África. O homem primitivo descobriu depois que, se adicionasse menos água e fizesse uma massa, cozendo-a então em forma de bolo achatado, teria um produto que poderia ser guardado, conservando-se palatável até alguns dias depois. Deste modo, desenvolveu uma comida que podia ser levada numa jornada ou expedição de caça.
3 – A PEDRA LOMBAR
Tão logo os métodos de cultivo melhoram, foram seguidos pelas propriedades de “moagem” do grão. Desenvolveram-se cereais cujos grãos tinham cascas ou membranas exteriores mais facilmente removíveis. Há cerca de 5.000 anos apareceram na Ásia Menor os trigos para panificação, tendo-se seguido ao longo do tempo grande difusão e avanços relativamente rápidos na sua agricultura.
Implementos melhorados foram inventados, pois o homem descobriu que poderia produzir algo melhor se esfregasse os grãos para a frente e para atrás entre duas pedras. Para isto ele utilizou uma pedra razoavelmente plana como base e, com uma pedra menor, esfregava os grãos na maior. Este tipo de pedra de base nós chamamos de lombar, porque se tornava côncava com o uso, e muitas delas foram encontradas em comunidades pré-históricas de diferentes partes do mundo antigo.
Usado em conjunto com uma peneira manual, o método de trituração da pedra lombar representou o primeiro “sistema de moagem” ainda que primitivo. Os grãos eram reduzidos a uma farinha grossa mais por uma ação de fricção do que a de batimento, usada no pilão e almofariz. Este tratamento mais brando proporcionava uma remoção mais fácil da membrana da semente, resultando assim um repasto mais palatável ou mesmo já um tipo de farinha.
Um certo grau de habilidade se tornou essencial na preparação desta farinha. Era costumeiro romper o grão com o pilão e almofariz, remover o farelo pela peneiração e completar a “moagem” com a pedra lombar. A farinha grossa obtida era então novamente peneirada para se produzir uma farinha mais fina.
Entretanto, os instrumentos primitivos de moagem eram pequenos implementos usados exclusivamente no lar para provir as necessidades de uma única família. Não foi antes de 3.000 anos atrás que o homem começou a fazer pedras lombares maiores e de maior produtividade. O equipamento aperfeiçoado significa que um homem se tornava capaz de produzir mais do que as necessidades de sua própria família, e assim nascia a figura do moageiro profissional. Os primeiros estabelecimentos comerciais foram uma mistura de moinho e padaria, sendo o produto final pão levedado visto que, por esta época, tinha-se também descoberto como usar agentes de fermentação para área até então bolos chatos da consistência de um tijolo.
Temos conhecimento de que, ao tempo da civilização egípicia, a moagem tinha se tornado uma indústria ao ponto de produzir farinha e pães para os faraós, porque possuímos um registro da operação completa desenhada na parede de uma pirâmide, dentro da tumba de um faraó. É interessante observar-se a imagem da farinha grossa sendo peneirada para produzir-se uma farinha branca, consumida por aqueles que pudessem dar-se ao luxo dela 4.600 anos atrás.
4 – O MOINHO DE ALAVANCA
Com o tempo, maiores aperfeiçoamentos foram incorporados no equipamento de moagem. A pedra lombar foi modificada e aumentada, sulcos foram cortados nas superfícies de fricção e métodos de retenção do grão na pedra de triturar superiores, ao mesmo tempo em que era alimentado sobre a pedra inferior, foram introduzidos.
Até este momento, todos os métodos de moagem eram realizados através do movimento alternativo, ou para cima e para baixo, ou para frente e para trás, e ainda requeriam um homem para operá-los.
Há 2.500 anos houve uma evolução para o chamado moinho de alavanca como elemento multiplicador da força humana. Atuava de uma forma nas quais os grãos eram submetidos a uma forma de corte e trituração simultânea, entre duas pedras retangulares ranhuradas, a menor fixa por um eixo na parte traseira sobre a pedra base e movida de um lado para outro num arco horizontal plano, através de uma barra que a atravessa de trás para frente. Os grãos eram alimentados por cima, por intermédio de um buraco escavado na pedra menor móvel.
5 - O MOINHO DE AMPULHETA
O importante passo a seguir foi o uso do movimento rotativo na moagem, que parece ter ocorrido primeiro com os romanos há cerca de 2.300 anos, na parte leste do Mediâneiro.
Os assim chamados moinhos de ampulheta, pareciam e operavam como tal, ou como um cabrestante oco com a parte de cima atuando como funil de alimentação. Eram feitos de pedra vulcânica macia e podiam se operados tanto por tração humana como animal, embora fossem mais comumente arrastados em um lento movimento circular por escravos presos às alavancas laterais. Por causa da lentidão de seu deslocamento, não se gerava força centrífuga suficiente para jogar para fora os produtos da moagem, devido ao que se idealizou a forma cônica da pedra inferior. Vários destes moinhos foram achados nas escavações da cidade de Pompéia, soterrada por uma erupção vulcânica no ano 79 DC. Representaram um grande passo na história da moagem, sendo logo seguidos pela chamada mó manual, que substitui a pedra lombar nos lares e foi largamente utilizada até o final do século XIX.
Consistia mó de uma pedra base circular, chamada Mela, que era suavemente levantada no centro em forma de sem ícone, e exteriormente de uma pedra rotora circular de topo, chamada Castillus, em forma de um duplo cone invertido, possuindo um buraco no centro e sendo vagamente oca por baixo, encaixando-se assim na pedra de base. Esta pedra rotora era girada com uma mão por uma alavanca, enquanto que com a outra a pessoa alimentáva-a com um punhado de trigo a cada pouco. Este tipo de pedra dupla foi parte do equipamento padrão do exército romano, e se difundiu através de todo o Império, tendo sido descrita por Plínio no seu livro “História Natural”.
6 – MOINHOS DE PEDRAS PLANAS
Por volta de 2000 anos atrás começou - se a usar a tração animal, através de cavalos, em pedras com a forma de discos superpostos. Pouco tempo depois a tração animal foi cedendo lugar à força hidráulica, embora esta já fosse usada na Turquia em 500 AC. As pedras talhadas em forma horizontal plana, e numerosos moinhos à força d’água foram construídos pela Europa.
O primeiro tipo de moinho hidráulico tinha uma hélice de duas pás, em forma de remo com pás inclinadas, chamadas pena de rodízio, que era fixada horizontalmente na ponta inferior de um eixo vertical que guiava a pedra rotora em cima, através de um orifício na pedra base. A pena de rodízio ou era colocada ao lado de um curso d’água de rápido movimento, ou então o fluxo d’água era nela dirigido de cima.
Um aspecto interessante da evolução da tração manual para a hidráulica foi a revolução gerada em termo do trabalho humano, pois constituía até então a moagem uma tarefa doméstica, própria das mulheres, que freqüentemente lhes ocupava todo o dia. Assim, esta mudança foi percebida pelos poetas que se maravilhavam com a novidade, mas ao mesmo tempo advertiam contra os seus perigos morais: o que fariam agora as mulheres? O inverno logo se difundiu para outros lugares, e poeta grego Antipater de Tesalaria o relatou com os seguintes versos:
"Deixai de moer, oh mulheres
Que no moinho trabalhais
Sigais dormindo, até que os galos
Cantem a chegada das horas matinais
Demeter ordenou às ninfas d’água
Que façam o seu trabalhar
Saltando na roda, fazem girar o eixo
Que move as grandes pedras de molar."
O moinho d’água se difundiu tão rapidamente por causa da simplicidade de seu desenho, e porque aliviava uma tarefa doméstica especialmente pesada e monótona, como era então moer grãos de cereais. Como diria um anunciante moderno, se tornou “indispensável em todos os lugares”.
Os romanos acharam uma maneira de montar a roda d’água num plano vertical, fazendo um eixo horizontal impelir um eixo vertical através de um encadeamento simples de engrenagens. Um arquiteto romano, chamado Vitruvius, foi o primeiro a descrever um moinho deste tipo, em grande detalhe no seu livro “De Archiectura” no ano 19 AC.
Ainda assim, o moinho d’água tinha as suas limitações. O seu rendimento não impressionaria muito pelos critérios atuais e, ademais não era de fácil regulagem. Os primeiros aperfeiçoamentos no seu projeto foram uma engrenagem de redução entre a roda hidráulica e a pedra rotativa. Logo se considerou necessário regular a velocidade da roda, que dependia principalmente da velocidade da corrente d’água, para obter-se um melhor rendimento.
Nos primeiros séculos depões de nossa foi se estendendo, com relativa lentidão, para fora das fronteiras do Império Romano, ate o norte da Europa. Não há dúvidas, segundo o arqueólogo dinamarquês A. Steenberg, que já era conhecido na Dinamarca na época do nascimento de Cristo. No século IV os romanos construíram um grande sistema de moinhos em Barbegal, perto de Arles na França atual. A água chegava do rio Arcoules por meio de um aqueduto de consideráveis dimensões - 2 m de largura por 5,6 m de profundidade – e com uma inclinação de 30°. Havia oito pares de rodas hidráulicas em seqüência, cada uma com um diâmetro de 2,2 m e uma largura de 70 cm, e movendo um par de pedras de moer cada. A produção de farinha, calculada em 2,8 ton diárias, era muito superior às necessidades locais, a maior parte sendo embarcada para Roma no porto de Arles.
Um caso particular de moinho Hidráulico foi sob a forma flutuante, e muito interessante a historia de sua invenção. No ano de 537, estando Roma sitiada pelos godos, tinha sua defesa ao cargo general bizantino Belisafrio, o qual um ano antes havia ocupado a maioria das províncias romanas na península itálica. Naquela época, grande parte dos moinhos d’água era alimentada por aquedutos. Com a intenção de vencer através da fome os romanos, o exercito godo cortou os suprimentos de água dos aquedutos, impossibilitando a moagem de trigo. Belisario, no entanto, encontrou uma solução. Inspirando-se provavelmente no barco impulsionando por pás, descrito no “Anonimus Bizantinus”, fez instalar moinhos a bordo de embarcações amarradas no rio Tibério, e com isto assegurou o fornecimento de farinha.
As noticias desta iniciativa se estenderam em todas as direções, e poucos séculos depois havia moinhos flutuantes em Veneza e em Bagdá. No século XII foram construídos três deles sob os arcos da Grande Ponte de Paris e, ao final da Idade Média, havia muitos outros funcionando nos grandes rios europeus, moendo grãos ou bombeando água. Em uma lei irlandesa do século VII, “Suncchus Mor”, mencionam-se moinhos d’água, e sabendo que também já existiam na Europa Central.
Depois da desintegração do Império Romano, a maioria dos produtos de sua tecnologia avançada – aquedutos, banhos, circos, etc. – caiu em desuso, mas os moinhos d’água continuam a aperfeiçoar-se. Isto ocorreu devido ao fim da escravidão, a qual dispensava o recorrimento às máquinas. A transformação dos escravos em servos, privando os senhores de suas ferramentas animadas, e aparição da “Banalidades” impostos medievais em espécie que, obrigando os servos a levar seus grãos ao moinho do senhor, proporcionava a este um aprovisionamento regular, tornava rentável a construção dos moinhos d’água. Só os senhores medievais podiam construí-los, devido aos capitais que dispunham, mas apesar disso se multiplicaram após o ano 1.000.
No ano de 1.086 o censo territorial de Doomsday indicava a existência de mais de 5.600 moinhos hidráulicos na Inglaterra atual, embora tenha - se que considerar que já por esta época era usado como força de tração na trituração de produtos da olericultura, da cervejaria e de curtume, e para a martelagem dos metais. Assim mesmo, tendo-se em conta a população do país nesta época, calcula-se que havia um moinho para cada 400 habitantes, isto que a Inglaterra naquele período situava-se ainda “nos limites exteriores da civilização européia”.
A seguir, no segundo capitulo – dos moinhos de vento ao moinho de cilindro atual.
HISTÓRIA DA MOAGEM DE TRIGO - 2° CAPÍTULO
No primeiro capitulo vimos como o homem primitivo da Idade da Pedra, nos períodos Eolítico, Paleolítico e Mesolítico até 10.000 anos atrás, conta o trigo de uma forma arcaica. Na era Neolítica, com a revolução agrícola, começou a se estabelecer em comunidades e a cultivar o trigo em maior escala, aprimorando assim sua forma de consumo pela necessidade de torná-lo mais palatável. A criação do pilão e almofariz e posteriormente da pedra lombar representou o primeiro sistema de moagem. A civilização egípcia trouxe o moinho de alavanca, e os romanos, mais práticos, introduziram o moinho rotativo, inicialmente sob a forma de ampulheta e após com as pedras planas, movimentadas pela força d’água.
7 – O MOINHO DE VENTO
Em algumas partes do mundo não havia correntes d’água capaz de fornecer uma força de tração para movimentar as pedras de moer. Ou as correntes eram lentas ou insuficientes, precisando – se assim nestes lugares de uma outra fonte de energia.
A idéia da utilização do vento surgiu da observação das velas dos barcos. Um navio mediante uma pequena inclinação em suas elas. Do mesmo modo, pensou – se que poderia – se, girar uma palheta presa a um eixo e, circulo, mesmo quando fosse colocada perpendicularmente ao vento, desde que ligeiramente inclinada.
As mais remotas referências conhecidas dos moinhos de vento são de um construtor persa de moinhos no ano 644 DC, e de moinhos eólicos já existentes em 915 DC na província de Seistan na Pérsia, atual Irã, descrita moinhos foram um mecanismo composto de um roda com palhetas se irradiando de um eixo vertical, de maneira semelhante às palhetas hemisféricas de um anemômetro moderno, no meio de um prédio fixo, com aberturas diametralmente opostas para a entrada e a saída do vento. Este tipo de roda era corrente na Ásia Central naquela época, como foi descrito pelos viajantes cineses do século V, constituindo o que hoje chamaria - mos de “moinho de vento horizontal”. O eixo vertical de cada moinho movia diretamente um único par de pedras, sem engrenagens intermediarias, como nos primeiros moinhos hidráulicos. Á exemplo destes eram construídos em dois pisos, as palhetas no inferior e as pedras de moagem – uma delas fixa – no superior. Apesar da semelhança, é improvável que existisse alguma conexão direta entre as pás dos moinhos d’água e as palhetas do moinho de vento, mesmo que a forma das pedras mais, as duas construções apareceram em regiões de paisagens completamente diferentes, adequando-se cada uma ao seu meio. Os construtores persas de moinhos, feitos depois prisioneiros das forças de Gengis Khan, foram enviados para a China a fim de orientar a construção de moinhos, e desde então seu uso lá para a irrigação tem permanecido, apesar de possuírem hoje uma forma diferente. O moinho horizontal foi ainda utilizado na Criméia e reinventado e utilizado, embora não de forma extensiva, na maioria dos países europeus orientais e nos Estados Unidos. Suas Limitações, no entanto, eram consideráveis, apesar de desenvolvimentos posteriores recentes como o rotor “S” do finlandês S. J. Sivonius.
Existem muitas opiniões diversas sobre como estes conhecimentos se estenderam à Europa. Pode – se aceitar que seguiram duas islâmica, via Marrocos e Espanha, e a segunda através das rotas comerciais que atravessavam a Pérsia e o Mar Cáspio, subindo pelos rios russos ate os Paises Bálticos e o norte da Europa. Também os vikings, que ate lá viajaram, devem ter contribuído para a difusão desta técnica. De qualquer forma foi no século XII, durante as primeiras cruzadas, quando havia muitas rotas de viagem através da Europa para a Turquia e Terra Santa, que os moinhos de vento se espalharam rapidamente. Sua primeira menção aparece numa bula papal de 1105, na qual se concede permissão ao abade de Sevigny para construir moinhos nas Dioceses de Bayeux. Coutences e Evrex, na atual França. Temos depois a referência de um no mesmo país em 1180 e na Inglaterra em 1187, ocorrendo também já durante o século XII na Holanda. Encontramo – los após na Bélgica e difundindo – se no século XV para a Polônia e a Suécia.
Na Europa o moinho de vento sofreu a influencia direta do moinho hidráulico romano, já desenvolvido, o qual possuía uma transmissão de ângulo direto para as pedras através de um único par de engrenagens, originando – se assim desta fusão o “moinho de vento vertical”, com as velas pressas a um eixo horizontal.
Se classificavam segundo a forma de manter as velas ou palhetas na direção do vento.
A forma mais primitiva do moinho vertical é conhecida pelo nome de “moinho de poste” devido a sua construção sobre um cepo de árvore ou poste de madeira bem escorado, encaixado num barrote horizontal ao nível do segundo piso do corpo do moinho. Este era em forma de caixa e continha a transmissão de moer e as máquinas auxiliares, suportando ainda o peso do velame. A estrutura inteira rodava sobre mancais montados no poste, de frente ao vento, dando – se o acesso ao corpo por uma escada manual na parte posterior do moinho. Usualmente o poste e sua fundação estavam acima do nível do solo, mas algumas vezes eram enterrados num monte de terra, ao que se denominava de “moinho de poste enterrado”. O alicerce era frequentemente protegido por uma construção circular a qual se tornava então simplesmente um depósito.
No século XV as pedras e engrenagens começaram a ser colocadas numa torre fixa com um topo móvel, ou “chapéu”, que suportava as velas e podia ser girado em volta sobre um trilho ou guia no topo da torre. Denominava – se a esta forma de “moinho de torre”, sendo as torres de pedra e/ou de tijolos usualmente redondas, e a de madeira ocelogonais e atusadas, conhecidas na Inglaterra como “moinhos de bata”, por parecerem uma bata feminina. As ilustrações mais antigas conhecidas de moinho de torre datam de 1420, sendo logo já achados por toda a Europa,. Posteriormente os britânicos, holandeses, franceses e outros colonizadores levaram estas construções para a América.
No início par de pedras para a montagem dos grãos, através de um sistema de engrenagens de um estágio. Por volta de 1430, contudo, os Paises Baixos precisavam mais do que apenas a força humana e animal para a drenagem da terra de forma eficiente. Assim os holandeses inventaram o “moinho de poste oco”. Neste, um eixo aprumado levava o movimento por dentro do poste oco e dirigia uma roda de alcatruzes, assemelhando – se a uma roda propulsora de barco a vapor, elevando assim a água de um nível mais baixo para um mais alto. Eram utilizados dois pares de engrenagem, respectivamente no topo e na base do eixo vertical, e este desenvolvimento abriu caminho para a construção de moinhos de torre maiores, movimentando vários pares de pedra e máquinas auxiliares.
Para um trabalho eficiente, as velas do moinho deveriam facear o vento de forma bem ajustada, e nos primeiros tipos o movimento do corpo, no moinho de poste, ou do chapéu, no moinho de torre, era realizado manualmente pelo moageiro, empurrando uma longa trava de madeira traseira que se estendia para baixo até o solo, fora do moinho. Em muitos casos, inclusive, o moageiro morava com a família dentro da torre, pois a tarefa de ajustamento também de controle demandava uma dedicação absoluta em termos de tempo, dificultando também a construções de moinho maiores. Mais tarde uma série de pequenos postes foi colocada em volta do moinho, uma manivela fixada em um deles e uma corrente encadeada entre a manivela e a parte final inferior da trava traseira, de modo a diminuir o esforço para movimentar o moinho. Manivelas, da mesma forma, foram colocadas nos chapéus dos moinhos de torre e operadas de dentro ou através de uma corrente sem fim do chão. A trava, como o nome diz, também servia para fixar a estrutura no solo, conservando – a direcionada para o vento. A primeira descrição detalhada da construção de um moinho deste tipo foi publicada na França em 1702 e os primeiros desenhos satisfatórios de montagem na Holanda em 1727, no livro “Achitectura Mechanica”, de Peter Linperch.
As velas dos moinhos mais primitivos eram triangulares, chamadas Bujarronas, envoltas em mastros escarados num gurupés que se estendia na frente da haste de vento. Eram achadas na Península Ibérica, Açores, Ilhas Mediterrâneas, Grécia e Turquia, sendo utilizadas de 8 a 12 velas em cada moinho. Nos moinhos mais desenvolvidos as velas eram montadas sobre um eixo ou haste de vento inclinado para cima, num ângulo de 5° a 15° com a horizontal. Nesta haste, dentro do moinho, aparecia a primeira roda engrenada conhecida como “roda de freio”, porque um reio de contração atuava na sua periferia. As primeiras rodas de moinho eram estruturas de madeira na qual o pano da vela ou lona era colocada, sendo cada vela ajustada individualmente com o moinho parado. As primeiras velas eram superfícies planas inclinadas num ângulo constante na direção da rotação, e mais tarde foram construídas com uma torção, e idêntica àquela das hélices de um avião moderno. O numero normal de velas era quatro, e John Smeaton em 1759n foi o primeiro a investiga – lás de modo cientifico, preferindo o numero de conco. Contudo até moinhos com seis e oito velas foram também construídos. Ele e outros na Inglaterra começaram a usar o ferro fundido no trabalho de moinho por esta época, à medida que seu uso foi se estendendo para outros campos. Além da moagem de milho e na elevação de água pelos holandeses, foi utilizado nas serrarias de madeira, na extração de óleos vegetais e na manufatura de papel. No próprio moinho da farinha a força do vento era utilizada para a colocação do grão nos silos, movimentando um guindaste de sacos e assim alimentando as moegas das pedras por gravidade, sendo instalados alarmes de sino para alertar quando necessitassem reabastecimento.
Assim a utilização de uma fonte incontrolável de força para produzir trabalho foi o problema superado pelo homem na construção dos moinhos eólicos. Seu uso se espalhou de forma crescente na Europa por 650 anos, de século XII até começo do século XIII. Seu lento declínio, devido ao desenvolvimento da máquina à vapor, persistiu pelos cem anos subseqüentes. Sua rápida extinção, excetuando – se na Holanda, começou depois da Primeira Guerra Mundial, com o desenvolvimento do motor de combustão interna e a disseminação do uso da energia elétrica. Mas continua sendo utilizado como força de tração para o bombeamento da água e na geração de energia elétrica.
8 – OS SISTEMAS DE CONTROLE
A introdução dos moinhos d’água e de vento teve um grande efeito de desenvolvimento para a mecânica, originando muitos novos ofícios antecessores daqueles dos modernos engenheiros. Um dos grandes gênios do renascimento italiano do século XV, Leonardo da Vinci, se interessou pelo assunto. Estudioso da hidráulica e, ao mesmo tempo, tentando melhorar a técnica de moagem, fez vários desenhos de rodas d’água e de vento com o uso mais eficiente do curso d’água e do vento, seguindo sua direção. Ele também projetou uma máquina estranha para moer grãos, na qual depois de moídos eram levados a um canal coletor envolvido numa manga de tecido, sacudida por intermédio de uma vara conectada às engrenagens do moinho, de forma que a farinha passasse através deste “filtro” separando – se do farelo. Mais tarde este invento seria utilizado nos separadores centrífugos dos moinhos atuais.
Através dos métodos de regulagem dos moinhos muitas técnicas foram desenvolvidas e, no século XVIII, no limiar da Revolução Industrial, apareceram vários sistemas que mais tarde adquiriram grande importância industrial.
Um dos problemas ao moer era fazer o grão entrar a uma velocidade adequada, evitando que o moinho - fosse de água ou de vento – ficasse moendo vazio e deteriorando, consequentemente, as pedras. Em outras palavras, se necessitava de um regulador de fluxo, sendo que uma das primeiras versões apareceu durante o renascimento, descrita no livro de Agostinho Ramelli, “Lê deverse et artificiose machine”, em 1588. Na primeira parte do século XVIII este regulador adquiriu a forma que conservaria até o final da era dos moinhos de vento. O grão era conduzido para uma caixa larga, em cujo fundo havia um transportador vibratório, golpeado alternadamente através de proteções montadas sobre a pedra rotativa. Quanto mais depressa girasse a pedra, portanto, mais grãos penetravam para a moagem.
No caso dos moinhos de vento, no geral eram construídos em lugares onde o vento soprava de uma determinada direção, e quando esta mudava devia – se orientá – lo para que as velas recebessem o ar de frente, aumentando o seu rendimento. Durante o século XVIII surgiram várias idéias para automatizar este trabalho.
Em 1745 o inglês Edmund Lee inventou a trava de vento automática, ou “cauda em leque”. Consistia de um conjunto de cinco a oito palhetas montadas na trava traseira ou escada manual do moinho de poste, em ângulo reto às velas de frente, ou conectada por engrenagens às rodas que giram num trilho em cota do moinho de torre. Quando o vento mudava de direção atingia os lados assim empurrando o corpo ou o chapéu até que as velas estivessem de novo alinhadas com o vento. No caso do moinho de torre, para o qual era mais apropriada, a cauda em leque movia em baixo do chapéu um parafuso sem fim engrenado numa roda cremalheira, sendo que o eixo do parafuso podia ser movimentado manualmente. Este dispositivo assim alcança a grande difusão na Inglaterra e norte da Alemanha, facilitando a vida dos moageiros.
Na moagem a qualidade da farinha dependia basicamente de dois fatores: a velocidade de rotação da pedra rotativa e a distância entre a pedra fixa e a giratória.
Durante o século XVIII tornou – se um desafio regulá – los. Em 1772 o escocês Andrew Meikle inventou a “vela de molas”, substituindo o pano das velas por persianas articuladas, idênticas às de uma veneziana, e controlando – as por uma barra de tração e uma mola em cada vela. Cada mola tinha de se ajustada individualmente com o moinho parado, de acordo com a força requerida, tornando – se as velas dentro de certos limites auto – regulantes, mantendo sempre a mesma velocidade de rotação.
Em 1787 o inglês Thomas Mead patenteou um projeto que combinava a solução dos dois fatores. As pedras se mantinham separadas quando o moinho estava parado, mas ao começar a funcionar um regulador as apertava uma contra a outra, com uma força proporcional à rotação. Era o chamado “regulador centrifugo” que, adaptado com o sistema de variação da superfície das palhetas, permitia o controle da velocidade da pedra giratória e da distância entre ela e a pedra fixa, tornando assim constante a granulação dos produtos da moagem.
Em 1789 Stephen Hooper, na Inglaterra, utilizou anteparos giratórios em vez de persiana e inventou um controle remoto, que permitia a ajustagem simultânea de todos os anteparos enquanto o moinho trabalhava. Em 1807 Sir. Willian Cubbit inventou a “vela padrão”, combinando as persianas articuladas de Meikle com o controle remoto de Hooper, por uma corrente presa de um lado a um contrapeso na direção do solo, e de outro lado a uma vara que passava através de um buraco perfurado na haste de vento. A operação se tornava assim semelhante ao abrir e fechar de um guarda – chuva, e pela variação do peso pendurado na corrente as velas foram tornadas auto – regulantes, podendo – se variar sua velocidade com o moinho em funcionamento. As palhetas de Cubbil se tornaram usuais durante todo o século XIX.
Em 1860 houve mais desenvolvimento no moinho de vento, com a aplicação de freios de ar em velas padrão, de acrofólios de orientação nas bordas e de outras formas que aumentaram a produção dos moinhos tornando – os capazes de realizar trabalhos úteis mesmo com ventos mais fracos. Foram produzidas velas articulares longitudinalmente na Inglaterra, Alemanha e na Holanda, prolongando a utilização desta força de tração, até que outras viessem a suplantá – la definitivamente.
A seguir, no próximo capitulo – o moinho a vapor e o moinho a cilindro.
HISTÓRIA DA MOAGEM DO TRIGO – 3° CAPÍTULO
9 – MOAGEM NO NOVO MUNDO
Ao colonizar as Américas, os europeus trouxeram a habilidade da moagem do trigo. No Brasil, país tradicionalmente importador de farinha, ocorreu com a chegada dos imigrantes do século XVIII. Os moinhos de trigo só teriam sido construídos a partir de 1733, data em que haviam chegado do Reino Português as primeiras pedras. O certo é que a partir da segunda metade do século XVIII estabelecia – se a primeira experiência histórica de produção agrícola de trigo e a sua transformação industrial em farinha. Era o complexo moinho – trigo instalado com baixo padrão tecnológico, aproveitando basicamente os elementos da natureza como fonte de potência: as correntes de água e o vento. Origina – se assim inclusive o nome de um bairro de P. Alegre, onde eram erigidos movidos pelo vento: o Moinho de Vento. De qualquer forma, no Brasil ainda se importava pelos portugueses, com a importação de produtos de básicos por causa das monoculturas.
O primeiro moinho movido à água na América do Norte foi em Annapolis, estado de Nova Escócia, em 1607 no Canadá. O primeiro acionado pela força do vento em Jamestown, estado da Virginia, em 1621 nos Estados Unidos. À medida que a colonização foi se alastrando, muitos outros hidráulicos e eólicos, e até mesmo ainda com tração de cavalos, foram montados. Lá o transporte de trigo até os moinhos constituía um problema sério, e consequentemente eram construídos ao longo dos rios, aproveitando os únicos meios de transporte então existentes. O estado de Nova York podia receber trigo via fluvial e através dos grandes lagos de várias regiões, tornando – se assim o centro mais importante de moagem por volta de 1644. Em 1686 a indústria da farinha tinha crescido tanto em importância no estado que seu brasão de armas foi redesenhado, incluindo – se um par de velas de moinhos de vento e dois barris de farinha. Casualmente George Washington, antes de se tornar presidente americano em 1776, foi um dos mais importantes moageiros, possuindo também um moinho Thomas Jefferson, o terceiro presidente.
A maioria dos desenvolvimentos na moagem tinha ocorrido até este momento na Ásia Menor e na Europa. Contudo, um dos desenvolvimentos de maior alcance para a indústria moageira aconteceu nos Estados Unidos durante a vida de Washington, perto de Newport, estado de Delaware. Em 1782 um homem chamado Oliver Evans foi contratado para montar um moinho. Pouco o intimidou o fato de jamais ter realmente construído um, e isto talvez até tenha ajudado, pela inexistência de idéias pré – concebidas para anuviar sua mente inventiva.
Até aquela época havia muitas operações manuais com o trigo e a farinha durante o processo de moagem, requerendo bastante mão de obra. Basicamente Ewvans criou um sistema de movimentação mecânica, introduzindo quatro inovações na indústria. Em primeiro lugar utilizou pequenas caçambas presas a uma correia de transmissão para a elevação da matéria prima e dos produtos, da parte de baixo para o topo do moinho. Depois ele usou dois tipos de transporte mecânico horizontal, através de uma rosca de Arquimedes e de um transportador de arrasto. Por fim, inventou um mecanismo para esparramar o produto aquecido vindo das pedras, de modo a esfriá – lo. Após o resfriamento, o mecanismo podia ser revertido e usado para coletar o produto, juntando – o e alimentando – o numa moega para a próxima operação. O moinho todo era acionado por três rodas hidráulicas, e suas pedras controladas automaticamente. A farinha, depois de pesada também de forma automática, era uma rosca e introduzida diretamente no depósito de um barco, parado sobre o rio que ladeava o moinho. Ao começar a operar em 1785, este moinho diminuía assim pela metade a força de trabalho necessário, sendo também capaz de produzir uma melhor extração de farinha. Pode ser considerado, portanto, um dos precursores da fábrica totalmente automatizada, tornando moagem uma indústria de processo continuo e completamente mecanizada, e abrindo caminho para a construção de moinhos maiores. Mais uma vez a moagem o trigo era a pioneira de uma concepção importante mais tarde usada em muitos outros processos industriais.
10 – O MOINHO A VAPOR
No mesmo período de Evans, James Watt na Inglaterra estava desenvolvendo seu motor a vapor. Inicial os industrialistas não vislumbravam o potencial desta máquina, de modo que Watt precisava de alguma indústria onde pudesse colocá – la para mostrar sua eficiência. Assim, junto com seu sócio Bouton, construiu em 1786 o moinho Albion em Londres, no lado sul da ponte de Blackfriars, no qual foi instalada a primeira máquina grande de vapor com movimentos rotativos. O motor impedia seis pares de pedras, mais tarde aumentadas para vinte e acionadas então por dois motores a vapor. O construtor das máquinas do moinho foi o nosso já conhecido escocês Adrew Meickle (1719 – 1811), que mais tarde instalou também reguladores centrífugos nas pedras. Isto foi muito importante no desenvolvimento do motor a vapor, pois tendo Boulton visitado do moinho em 1788, comunicou para a Watt ter visto o funcionamento dos reguladores, descrevendo – os. Watt se deu conta imediatamente da possibilidade de aplicar o mesmo principio no controle da velocidade dos motores a vapor, que sem isto não teriam o desenvolvimento posterior ocorrido. O moinho de trigo de Albion foi destruído pelo fogo em 1791, em circustância bem estranha fixado, no entanto o uso do motor a vapor como fonte de potência para a indústria.
11 – O MOINHO DE CILINDROS
Até agora vimos a descrição da evolução dos moinhos através das diferentes fontes de energia utilizada para sua movimentação, ou mais especificadamente para a movimentação das pedras planas. As evoluções da tração humana para animal, e depois para a hidráulica, eólica e a vapor, no entanto, não haviam sido seguidas pela dos princípios básicos da moagem, ou seja, o uso da fricção com pedras planas ranhuradas.
Durante os séculos XVI e XVII, com as novas idéias introduzidas, o moinho foi gradualmente todo se automatizando. Pelo início do século XIX os elevadores de caçamba e as roscas hericoidais, já existentes no moinho de Evans, se difundiam rapidamente, tornando a trituração dos grãos e a peneiração e classificação da farinha um processo altamente mecanizado e automatizado. O motor a vapor foi importante não só porque proporcionou uma fonte de potência muito mais confiável, como também porque a precisão requerida na sua fabricação, que teve de ser desenvolvida, gerou muitas novas habilidades no campo que hoje chamamos de engenharia. Com estas habilidades novas, e os problemas que narraremos a seguir, tornou – se possível e necessário a construção de um novo tipo de elemento da fricção, substituindo as pedras. A passagem do trigo através de muita intensidade, em um percurso de mais de um metro. Até mesmo quando os trigos utilizados eram macios ou tenros e, portanto, relativamente resistentes à desintegração, parte da casca se transformava em pó, tornando a farinha escura. Os húngaros cultivavam trigos de excelente qualidade, mas cujos grãos eram duros com cascas frágeis, isto é, facilmente reduzíveis a pó. Não havia assim a possibilidade de se produzir uma farinha isenta de farelo, além do próprio pó de pedra que se consumia através do atrito. Tiveram de desenvolver no séc. XIX, portanto, o uso dos rolos de metal.
O registro do primeiro uso de um rolo ou cilindro para moer trigo foi uma ilustração de um moedor manual no livro já citado de Ramelli, em 1588. No entanto, para o moinho de cilindro competir com a pedra, já com técnica bem desenvolvida, necessitava de uma manufatura com alto grau de precisão, devido à relativa alta velocidade com que devia girar. Num par de pedras a pressão para a moagem dos grãos era efetuada pelo peso da pedra superior rotativa, ao passo que, no moinho de cilindro, a pressão devia ser exercida e suportada pelos mancais. Depois de várias tentativas de fabricação deste tipo de moinho pela Europa Central, nos começos do séc. XIX, a primeira com sucesso aconteceu nos moinhos de Josef Walzumhle, inicialmente na Suíça em 1830 e posteriormente em Budapeste, em 1839, efetivada pelo engenheiro suíço Jacob Sulzberger. Inclusive continua – se a moer trigo e produzir farinha no mesmo lugar na Suíça hoje em dia, sob o nome de Pester Walzmuhle Gesellschaft. O engenheiro suíço depois melhorou este tipo de moinho e construiu vários deles nas regiões tritícolas da Hungria, que por um tempo se tornou o centro mundial da produção de farinha.
12 – O SISTEMA DE REDUÇÃO GRADUAL
O século XIX foi relevante revolucionário para a moagem do trigo. Até então utilizava – se o método direto, cujo objetivo era moer o grão e procurar produzir farinha em uma única passagem através das pedras. Esta era então peneirada e separada dos resíduos que, se ainda continuassem um pouco de farinha, eram jogados de volta com o trigo para receber uma segunda trituração, misturando - se assim pó de farelo com a farinha.
Durante o período final do séc. XVIII e começo do séc. XIX outro sistema começou a ser desenvolvido na França. Os moageiros lá regulavam as pedras para apenas abrir o do grão e soltar a farinha. O material moído era então peneirado para a remoção de farinha, e o resto farelento com granulação mais grossa retorna à pedra para mais uma passagem. O processo se repetia iterativamente cerca de 5 ou 6 vezes, e as farinhas obtidas depois da primeira e segunda passagem se tornavam progressivamente mais escuras. A diferença com o método anterior era que se processava um lote de trigo por vez, em um único par de pedras regulado a cada passagem, ou com as diferentes passagens em pedras sucessivas, com diferentes regulagens. O moageiro tinha assim a opção de misturar todas as farinhas obtidas juntas na proporção em que eram produzidas, ou de vender parte da farinha mais branca a um preço superior.
Isto implica, contudo, que ele permanece com um produto residual de cor mais escura de que a mistura geral, aquilo que chamamos hoje de farinha de produção direta, numa alusão ao método antigo de moagem. O moageiro poderia, entretanto, melhorar a cor de sua farinha residual sugerindo parte da farinha de cor mais escura, com teor de resíduo mineral ou cinzas mais altas. Deste modo, utilizando o processo francês, poderia produzir farinhas com cor bem melhor que as produzidas com o antigo método direto, embora esta fosse mais rápido. Ou alternativamente poderia obter uma extensão bem melhor de farinha da mesma cor, aumentando o seu rendimento em qualquer uma das hipóteses.
13 – O SASSOR E O PLANSIFTER
Se alguém moe trigo bom e limpo, o único fator que pode estragar a cor da farinha é a inclusão do pó de farelo, ou da membrana exterior do trigo. Até mesmo hoje, com a toda a tecnologia sofisticada presente, não há maneira prática de separar o pó de farelo da farinha uma vez que tenha sido feita a mistura. Ou o moageiro tenta eliminar a presença do farelo na moagem, ou tenta moer de uma maneira tal que minimize a quantidade de pó de farelo produzido.
Pelo fim do séc. XVIII os moageiros começaram a procurar formas de reduzir a quantidade de farelo no produto que era colocado para a moagem nas pedras, conforme o novo processo francês. O problema era separar as partículas de farelo mais leves das partículas mais pesadas de endosperma ou semolina, embora de mesma granulação. A primeira idéia foi com o uso de correntes de ar para tirar ou desviar o farelo mais leve de um fluxo de produtos em queda, tendo sido patenteada uma máquina utilizando este principio em 1800. Seguiu – se a idéia do uso de uma peneira conjugada a correntes de ar, com o patenteamento de uma máquina utilizando este principio assim constuida na França em 1860, a qual foi claramente as predecessora do moderno purificador de sêmolas ou sasseur (sassor), e logo adaptada para os moinhos americanos. Estas máquinas, usada em conjunto com o sistema mais gradual de redução de endosperma do trigo em farinha, tornou possível a remoção de muitas das partículas de farelo que caracterizavam a farinha naqueles dias ou, em outras palavras, a extração maior de farinha melhorada de um mesmo tipo de trigo.
Não foi antes de 1860 também, quando o tamanho e a velocidade dos cilindros foram incrementados, que realmente começaram a mostrar grandes vantagens sobre as pedras, havendo então uma rápida mudança para os rolos metálicos. Isto ocorreu em maior escala, a principio, na Hungria, pelas razões já referidas, juntamente com a incorporação do purificador e do sistema de redução gradual. Apesar das dificuldades mecânicas experimentadas com os protótipos de rolos e purificadores, sua performace superior na produção de farinhas de qualidade com altas margens de lucros assegurou sua sobrevivência. Moageiros criativos e engenheiros moageros aplicaram – se na tarefa de melhorar estas máquinas e, ao mesmo tempo, aperfeiçoar a eficiência geral do moinho. Em 1873 o alemão Wegmann desenvolveu um sistema mais aperfeiçoado de cilindros, depois construído por Ganz, e que já tinha um regulador de ajuste de pressão dos rolos. Vieram então vários outros melhoramentos por Ganz (1880), Luther (1895) e pela firma Amme, Gieseck & Konegen em 1902 o ultimo dos quais já se mostrando quase como os cilindros de hoje, ao chegar – se finalmente no moinho diagonal.
O sistema de moagem de redução gradual era, portanto, já largamente praticado na França e principalmente na Hungria, tendo Budaposte no século XIX se tornando um importante centro de moagem, e muitas inovações de processo e de maquinas de já se originado. Seus moinhos produziam farinha de tal qualidade que não permitia comparações com a dos moinhos de pedra. A nova farinha era muito mais claras e finas que qualquer uma já produzida, e sua procura pelos padeiros tão grande que sua produção logo teve de ser limitada.
Nas outras partes da Europa e no leste dos Estados Unidos os trigos existentes eram então tenros, sem haver a necessidade de uma moagem mais suave. Mas quando os estados do nordeste dos Estados Unidos e as províncias do oeste do Canadá foram conquistados, as variedades de trigo que lá se adaptaram eram do tipo húngaro. Assim os moageiros americanos adotaram os novos métodos húngaros e, e pela crescente importância da produção de trigo daquelas regiões, foram logo seguidos por aqueles que importavam seu trigo. A isto se acrescentou o fato de que os consumidores de farinha ou dos produtos derivados dela não mais os aceitavam contendo uma proporção alta de pó de farelo. Por estas razões o sistema de redução gradual com o moinho de cilindro logo suplantou os ultrapassados métodos com as pedras planas.
Os moageiros de cada pais adotaram meios levemente diferentes para atingir seus objetivos, mas os princípios básicos de dividir o trigo em sêmolas, purificar, moer as sêmolas limpas e peneira – las foram incorporadas definitivamente no processo. Os moinhos de pedra que não se reequiparam logo com os cilindros tiveram que sair do negócio de moagem. Na Inglaterra em 1870, a farinha especial de moinhos e cilindros como era conhecida, começou a ser importada em quantidades crescentes, e antes que os moageiros ingleses tivessem tempo de se.
readaptar sofreu uma perda considerável de negócios. Os moageiros da “idade da pedra” resistiam ferozmente a esta tendência, mas a demanda pela nova farinha não podia ser refreada. Assim um conjunto grande de moageiros ingleses visitou a Hungria em 1877, ao que se se seguiu a construção do primeiro moinho de cilindros naquele pais em 1881. Nos dez anos subseqüentes a maioria dos moinhos com pedras foi se convertendo ou falindo, desde então ocorrendo, assim como em outras partes do mundo, quantidade significativa de produção de farinha com o método antigo. Para se adaptar às capacidades e áreas de superfície de peneiração necessária ao sistema de redução gradual, apareceu por volta de 1870 a ultima máquina principal no moderno processo de moagem. Era o plansichier (em alemão) ou plansifter (em inglês), outro produto dos engenheiros europeus de moagem, e que logo se tornou largamente utilizado nas funções desclassificação e peneiração do moinho. Substituiu o tambor e o centrifugador que levavam o efeito a peneiração em cilindros de rotação horizontal, cobertos com uma malha de arame ou seda. A mudança para os plansifters não foi de forma alguma tão rápida e certamente nem tão completa como tinha sido a mudança para o moinho de cilindros. Para a moagem de trigo macio, de baixa proteína, a peneiração centrifuga seria ainda mais eficiente que pelos plansifters, mas por razão de custo, espaço, potencia e mão de obra, ninguém poderia pensar hoje em construir um moinho usando somente aquele tipo de máquina para a peneiração.
Por esta época no Brasil surgiam já estes tipos de moinhos, e no Rio Grande do Sul o primeiro grande moinho com características modernas foi fundado em Rio Grande, em 1894, pelo comendador Albino José da Cunha, nascido em Portugal, com uma capacidade de inicial de 45 ton de farinha.
A redução gradual do grão do trigo é o principio no qual a teoria e a prática moderna de moagem hoje se baseia. A mediada em que o processo cresceu em importância, a divisão e a subdivisão do grão ao longo do moinho multiplicaram por muitas vezes a necessidades de transporte separados produtos da moagem. Assim grandes aperfeiçoamentos tinham de ser feitos no manuseio mecânico, côa a incorporação dos sistemas de transporte pneumático. Isto faz com que a automação na indústria de moagem já seja praticada há mais de 100 anos, e ainda esteja em progresso na medida em que são procuradas economias nos custos de produção.
14 – CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os moageiros moeram trigo em pedras por cerca de dois mil anos, sem qualquer grande mudança nos princípios básicos, mas em cerca de apenas 30 anos, no final do último século, a maior parte da Europa e América do Norte mudou seus métodos de moagem radicalmente. Tão impressionante quando este fato é o de que não tem havido mudanças fundamentais métodos e moagem desde então. As máquinas básicas foram desenvolvidas de forma a se adequarem com maiores fluxos de alimentação, aperfeiçoadas para melhorar seu ajustamento e eficiência, ganharam formas aerodinâmicas para facilitar sua limpeza e tiveram assim sua aparência modificada. Mas o rolo de cilindros, o sassor e a plansifter, as três principais máquinas num moinho são basicamente as mesmo os do inicio do século, assim como o método de moagem.
Alguns dos grandes moinhos construídos, naquela fase continuam ainda a transformar malhares de toneladas de trigo em farinha para consumo humano e resíduo para o consumo animal. Contudo, a moagem tem feito grandes avanços nos últimos trinta anos em termos de aumento de produtividade; O moinho moderno é capaz de ser operado eficientemente por uma força de trabalho quatro vezes menor daquela exigida até 1940. Além das melhorias no projeto das máquinas, tornando – as mais compactas e possibilitando ao moinho moderno ter sua área reduzida a um terço daquela de congênere de quarenta anos atrás, é hoje projetando com, o uso maximo de controles remotos e instrumentados automática. E equipado com aparelhos de alarme e de segurança de falças para compensar o menor numero de operários, e feito o uso extensivo do sistema pneumático de transporte de produtos intermediários e finais, estes armazenados e transportados a granel. Os produtos ensacados de plásticos ou de várias folhas de papel, e transportados por carregadeiras ou por sistemas helicoidais. O uso de aparelhos de regulagem eletrônica com a incorporação dos microprocessadores está levando o processo para uma automação total através de um computador central, onde um disquete ou fita magnética com todos os dados de extração, qualidade da farinha e quantidade a ser moída regula automaticamente as maquinas, como já é praticado em alguns moinhos da Europa e do Japão. Por fim a disseminação dos modernos processos por todo o mundo, com custos reduzidos, tornou possível a produção de produtos sadios, baratos e com alto aproveitamento do cereal escasso que é o trigo.
Hoje a maioria dos paises possuem pelo menos um moinho comercial para processar grãos em alguma forma de farinha. Mas há ainda milhões de pessoas nas áreas rurais mais atrasadas de alguns paises que continuam a cultivar suas próprias safras de cereais de forma rudimentar, armazenando a colheita em graneleiros e convertendo seus grãos em farinha do pilão e do almofariz, como faziam seus ancestrais há milhares de anos atrás.

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